sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

DEPRESSÃO NA ESQUIZOFRENIA COM SINTOMAS PSICÓTICOS

DEPRESSÃO NA ESQUIZOFRENIA COM SINTOMAS PSICÓTICOS
Foram as observações em relação à melhora do quadro depressivo em esquizofrênicos tratados com antidepressivos ou com antipsicóticos que acabaram sugerindo a hipótese de que os sintomas depressivos são uma parte integral da descompensação psicótica (Newcomer, 1990; Leff et al. 1988). Em surto agudo, 50% dos pacientes apresentavam sintomas depressivos concomitantes. Desses, metade desses melhoraram em 3 semanas e a outra metade continuou deprimida. Leff (1988) observou que 45% dos esquizofrênicos apresentaram humor deprimido, o qual regrediu com a melhora dos sintomas psicóticos.
Em geral, esses sintomas depressivos inerentes ao episódio psicótico agudo, começam no período pré-surto agudo (fase prodrômica) e intensificam no início da descompensação psicótica franca. Talvez os sintomas depressivos do episódio psicótico agudo não sejam tão percebidos porque outros sintomas psicóticos, como alucinações, delírios, desorganização do pensamento e do comportamento, sejam muito mais exuberantes.
DEPRESSÃO NA ESQUIZOFRENIA SEM SINTOMAS PSICÓTICOS
Quando a depressão ocorre na fase de estabilidade da esquizofrenia, isto é, depois de terem passado os sintomas psicóticos proeminentes, ela pode representar um quadro afectivo disfórico associado, uma depressão secundária ou um estado de sofrimento moral.
A Disforia Aguda se manifesta como uma associação de depressão e ansiedade simultaneamente. Em geral a Disforia está relacionada a um fator stressante desencadeante, portanto, tanto pode seguir a um Episódio Psicótico Agudo e regredir em até 3 semanas. Ou pode, como acontece mais comummente, anteceder em alguns dias o Episódio Esquizofrênico Agudo. Para pacientes já diagnosticados como esquizofrênicos, o surgimento de Disforia deve servir como alerta para a eclosão de um novo surto agudo.
Depois de um Episódio Esquizofrênico Agudo os pacientes podem, menos freqüentemente, evoluir para um quadro de Depressão Secundária. De fato, é essa Depressão Secundária que se constitui naquilo que se conhece hoje por Depressão Pós-Esquizofrênica ou Pós-Psicótica.
Esse tipo de depressão se assemelha a um episódio depressivo comum, com duração maior a duas semanas e quadro clínico típico de depressão (humor deprimido, desesperança, autodepreciação, idealização suicida, apatia, desinteresse, etc).
Muitas vezes os sintomas da depressão secundária da esquizofrenia são difíceis de diferenciar dos sintomas negativos da própria esquizofrenia. Entre os sintomas capazes de confundir o clínico está a apatia, desinteresse, alteração de sono, do apetite, a pobreza na socialização, diminuição da concentração e da atenção. Essa dificuldade de diagnóstico se justifica quando consideramos os sintomas próprios da esquizofrenia, os quais podem ser: ansiedade, culpa, falta de energia, perda do interesse no trabalho, diminuição do interesse social, diminuição da libido, desespero, desesperança, sensação de inutilidade e idealização suicida.
O Sofrimento Moral é a terceira possibilidade depressiva na esquizofrenia. Trata-se de um quadro crónico onde, apesar dos sintomas depressivos serem leves, chamam atenção os sintomas de desesperança. O que acontece aqui é um grande Sofrimento Moral (um dos sintomas básicos de depressão – veja).
O Sofrimento Moral ou, de acordo com outros autores, a Desmoralização Crónica é um estado de baixíssima auto-estima e desesperança grave, como uma resposta a um problema grave, real e permanente.
Normalmente o Sofrimento Moral tende a aparecer com mais gravidade quando existe, por parte do paciente ou dos familiares, uma grande expectativa de boa performance depois da doença. Aparece também quando o paciente tem uma boa noção da gravidade de sua doença. Segundo alguns autores, um grande Sofrimento Moral pode tornar a pessoa bastante incapaz e não haverá boa resposta aos tratamentos psicofarmacológicos tradicionais para depressão.
PSICOSE DELIRANTE CRÓNICA
(Paranóia)
Freud entendia a neurose como o resultado de um conflito entre o Ego e o Id, ou seja, entre aquilo que o indivíduo é (ou foi) de fato, com aquilo que ele desejaria prazerosamente ser (ou ter sido), ao passo que a psicose seria o desfecho análogo de um distúrbio entre o Ego e o Mundo.
Patch considera a psicose uma doença mental caracterizada pela distorção do senso de realidade, uma inadequação e falta de harmonia entre o pensamento e a afectividade.
A Psicose Delirante Cronica, que é sinónimo do actual Transtornos Delirante Persistente (CID.10), já foi chamada de Paranóia, muito apropriadamente. De acordo com Kraepelin, a Paranóia é uma entidade clínica caracterizada, essencialmente, pelo desenvolvimento insidioso de um sistema delirante duradouro e inabalável mas, apesar desses Delírios há uma curisosa manutenção da clareza e da ordem do pensamento, da vontade e da acção.
Ao contrário dos esquizofrênicos e doentes cerebrais, onde as ideias delirantes são um tanto desconexas, nesta Psicose Delirante Crónica as ideias se unem num determinado contexto lógico para formar um sistema delirante total, rigidamente estruturado e organizado.
A característica essencial desse Transtorno Delirante Persistente é a presença de um ou mais delírios não-bizarros que persistem por pelo menos 1 mês. Para o diagnóstico é muito importante que o delírio do Transtorno Delirante Persistente não seja bizarro nem seja desorganizado, ou seja, ele deve ter seu tema e script organizado e compreensível ao ouvinte, embora continue se tratando de uma falsa e absurda crença.
As alucinações não são proeminentes e nem habituais, embora possam existir concomitantemente. Quando existem, a alucinações táteis ou olfativas costumam ser mais frequentes que as visuais e auditivas.
Normalmente o funcionamento social desses pacientes Paranóicos não está prejudicado, apesar da existência do Delírio. A maioria dos pacientes pode parecer normais em seus papéis interpessoais e ocupacionais, entretanto, em alguns o prejuízo ocupacional pode ser substancial e incluir isolamento social. A impressão que se tem é a de uma ilha de delírio num mar de sanidade, portanto, uma espécie de delírio insular.
Um paciente, por exemplo, convencido de que será assassinado por perseguidores implacáveis pode desenvolver isolamento social e abandonar o emprego. Em geral, além do funcionamentos social comprometido, também o relacionamento conjugal pode sofrer prejuízos. Na Esquizofrenia o comprometimento social mais acentuado costuma ser a regra.
Esses Delírios normalmente são interpretativos, egocêntricos, sistematizados e coerentes. Pode ser de prejuízo, de perseguição ou de grandeza, impregnado ou não de tonalidade erótica ou com ideias de invenção ou de reforma. Também é frequente o delírio de ciúme, mais encontradiço nas mulheres. Estas estão sempre se deparando com provas "contundentes" acerca dos muitos relacionamentos sexuais de seus maridos.
TIPOS DE PSICOSES DELIRANTES PERSISTENTES
A - TIPO EROTOMANÍACO
Neste caso o delírio habitualmente se refere ao amor romântico idealizado e a união espiritual, mais do que a atracção sexual. Acreditam, frequentemente, ser amados por pessoa do sexo oposto que ocupa uma posição de superioridade (ídolos, artistas, autoridades, etc.) mas, pode também ser uma pessoa normal e estranha.
B - TIPO GRANDEZA
Neste subtipo de Transtorno Delirante Persistente a pessoa é convencida, pelo seu delírio, possuir algum grau de parentesco ou ligação com personalidades importantes ou, quando não, possuir algum grande e irreconhecível talento especial, alguma descoberta importante ou algum dom magistral. Outras vezes acha-se possuidor de grande fortuna.
C - TIPO CIÚME
Neste tipo de Paranóia a pessoa está convencida, sem motivo justo ou evidente, da infidelidade de sua esposa ou amante. Pequenos pedaços de "evidência", como roupas desarranjadas ou manchas nos lençóis podem ser coletados e utilizados para justificar o delírio. O paciente pode tomar medidas extremas para evitar que o companheiro(a) proporcione a infidelidade imaginada, como por exemplo, exigindo uma permanência no lar de forma tirana ou obrigando que nunca saia de casa desacompanhado(a).
D - TIPO PERSECUTÓRIO
É o tipo mais comum entre os paranóicos ou delirantes crónicos. O delírio costuma envolver a crença de estar sendo vítima de conspiração, traição, espionagem, perseguição, envenenamento ou intoxicação com drogas ou estar sendo alvo de comentários maliciosos.
E - TIPO SOMÁTICO (PARAFRENIA)
A Formação Delirante do Tipo Somático, como justifica o nome, caracteriza-se pela ocorrência de variadas formas de delírios somático e, neste caso, com maiores possibilidades de alucinações que outros tipos de Paranóia. Os mais comuns dizem respeito à convicção de que a pessoa emite odores fétidos de sua pele, boca, recto ou vagina, de que a pessoa está infestada por insectos na pele ou dentro dela, esdrúxulos parasitas internos, deformações de certas partes do corpo ou órgãos que não funcionam.
3 - PSICOSE REAcTIVA BREVE (Transtorno Psicótico Transitório)
A Psicose Reactiva Breve se caracteriza pelo aparecimento abrupto dos sintomas psicóticos sem a existência de sintomas pré-mórbidos e, habitualmente, seguindo-se à um stressor psicossocial. Os sinais e sintomas clínicos são similares àqueles vistos em outros distúrbios psicóticos, como na Esquizofrenia e nos Transtornos Afectivos com Sintomas Psicóticos. O prognóstico é bom e a persistência de sintomas residuais não ocorre. Durante o surto observa-se incoerência e acentuado afrouxamento das associações, delírios, alucinações e comportamento catatônico ou desorganizado. Há componentes afectivos com mudanças bruscas de um afecto para outro, perplexidade e confusão.
A Organização Mundial de Saúde, através da Classificação Internacional de Doenças (CID), recomenda que esta categoria de psicose deve ser restringida ao pequeno grupo de afecções psicóticas, em grande parte ou totalmente atribuídas a uma experiência existencial recente. Deve ser entendida como uma alteração psicótica na qual os factores ambientais tem a maior influência etiológica.
Trata-se de reacções cuja natureza não é só determinada pela situação psicotraumática, mas também pelas predisposições da personalidade. A maioria das reacções psíquicas mórbidas desenvolve-se em função de uma perturbação de carácter que predispõe a elas. Tal perturbação será fruto de um desenvolvimento psicorreativo anormal.
O desenvolvimento da Psicose Reactiva pode satisfazer a necessidade do paciente em representar, simbolicamente, a si e aos outros através da natureza interna de suas contradições, angústias e paixões, numa espécie de falência aguda de sua capacidade de adaptação a uma situação sofrível.
Deve haver na Psicose Reactiva Breve, de uma maneira ou outra, um certo lucro subjectivo na medida em que o paciente vive à margem da realidade traumática e insuportável; transfere seu próprio fracasso para um delírio persecutório, recolhe-se da realidade numa postura autística, nega a existência num estado amnésico e assim por diante. Pode ser de grande alívio a transferência da tonalidade afectiva de um objecto para outro, ou de um complexo de ideias para um outro complexo secundário psiquicamente anárquico, onde as coisas se encaixam numa lógica doentia e fantástica.
CAUSAS
Por definição, de acordo com Kaplan, um stressor vivencial significativo constitui um factor etiológico para este distúrbio, entretanto, melhor seria pensar nestes factores stressantes mais como desencadeantes do surto psicótico agudo. Portanto, a patologia terá bases tanto biológicas quanto psicológicas. Devem ser enfatizados os mecanismos de relacionamento inadequados e a possibilidade de ganho emocional primário ou secundário com a eclosão do surto agudo. Há hipóteses que a psicose representaria um mecanismo de defesa a um stressor específico.
SINTOMAS
A característica essencial deste distúrbio é o início súbito dos sintomas psicóticos que persistem por um tempo inferior a um mês, com eventual retorno ao nível pré-mórbido de funcionamento. Os sinais e sintomas clínicos são similares àqueles vistos em outros estados psicóticos, tais como na Esquizofrenia e nos Transtornos Afectivos com Sintomas Psicóticos.
O comportamento pode ser bizarro, com posturas peculiares, trejeitos esquisitos, gritos ou mutismo completo. Freqüentemente há significativa desorientação, confusão e distúrbios de memória. Alucinações transitórias, delírios e confabulações podem estar presentes. O quadro é mais frequente na adolescência e idade adulta jovem.
São frequentes, também, as modificações rápidas de um afecto intenso para outro, a perplexidade e regressão com atitudes pueris. O comportamento catatónico ou desorganizado é comum e isso pode confundir com os casos de simulação, Síndrome de Ganser ou mesmo histeria.
CURSO E PROGNÓSTICO
Não existem sintomas prodrômicos anteriores ao stressor desencadeante, embora possam existir traços de personalidade sugestivos de algum distúrbio prévio. O aparecimento da sintomatologia segue o stressor em poucas horas, não duram mais de um mês e a depressão posterior é frequente.
ASPECTOS DE BOM PROGNÓSTICO
Boa adaptação emocional pré-mórbida (antes do surto)
Poucos traços esquizóides de personalidade pré-mórbidos
Grave stressor emocional precipitante
Aparecimento agudo e repentino dos sintomas
Sintomas afectivos presentes (depressão, normalmente)
Confusão e perplexidade durante a crise
Pouco empobrecimento afectivo
Curta duração dos sintomas
Ausência de parentes esquizofrénicos
É muito difícil a diferenciação entre a Psicose Reactiva Breve e a Depressão Maior com Sintomas Psicóticos. Para tal distinção é fundamental a verificação minuciosa da personalidade pré-mórbida e suas associações com traços depressivos ou esquizóides. A abordagem antidepressiva medicamentosa consegue resolver grande número de casos, o que nos faz suspeitar do evidente envolvimento afectivo em tais transtornos, ainda que não tenha havido nenhuma manifestação prévia de depressão com nítidas características psicóticas. Teoricamente isso é bem possível, já que a eclosão da Psicose posterior à agressão emocional pode significar uma falência adaptativa às circunstâncias vivenciais, atitude perfeitamente compatível com a dinâmica da depressão.